No mês de junho, a Fatal Model vem promovendo uma campanha de conscientização no Mês do Orgulho LGBTQIA+. A campanha contou com peças publicitárias informativas nas redes sociais e, aqui no blog, foram publicados relatos de membros da comunidade LGBTQIA+, como Kelly Medeiros, Victória Dornelles e Junior Pacheco.
Além disso, o Fatal Blog contou com uma participação especial de Amara Moira, uma travesti, professora e que já atuou como acompanhante.
Assim também, como o debate sobre a Fetichização de mulheres lésbicas, comportamento que ainda é tão observado e enraizado na sociedade.
Mas hoje, trouxemos o último relato da série de entrevistas com acompanhantes da plataforma e membros da comunidade LGBTQIA+. Luiz Gabriel fala da sua luta diária como homem trans e como foi seu processo de transição.
Continue acompanhando.
A importância de ações no mês da visibilidade
Antes de mais nada, falar de ações apenas em um mês no ano não irá trazer a visibilidade necessária. Pois, o Brasil é um país que dificilmente vá extinguir com preconceitos, seja ele com a comunidade LGBTQlA+, negros e periféricos.
Algo que eu sempre digo é que se no Brasil existissem leis verdadeiramente rígidas, hoje não teríamos travestis, como Anyky Lima, nem homens trans, como o João Nery, mortos. Verdadeiramente, espero que esses nomes sejam sempre lembrados como sinônimo de resistência e luta da comunidade LGBTQIA+.
Anyky Lima faleceu esse ano de infarto, aos 65 anos, era uma mulher trans já idosa. Eu tive o prazer de conversar com ela, onde ela me relatou que mulheres travestis quando passam dos 35 anos, são esquecidas até mesmo pela própria comunidade.
João Nery, faleceu de câncer em 2018, mas deixou na terra um legado extremamente importante, e uma fala de notável relevância, não só para um homem trans, como eu, mas para toda sociedade.
Por isso, as ações contra o preconceito e cuidado da comunidade devem que ser diárias, principalmente, para trazer segurança a todas as pessoas LGBTQIA+, que vive em situação de vulnerabilidade, nas periferias e dentro da prostituição.
Como foi a descoberta do Luiz Gabriel?
A princípio, em minha infância, era uma sensação de liberdade, até o dia que eu comecei a crescer e me desenvolver fisicamente. Certo dia, a vizinhança do local onde eu morava começou a dizer “menina, vai colocar uma blusa, seu peito tá crescendo”.
No momento, o choro não saia, mas dentro de mim eu sentia alguém chorar. Era como se estivesse dentro de um armário, preso, e precisasse de um impulso para me desprender e sair.
Aos 13 para 14 anos, fui expulso de casa pelo meu pai. Vivi na rua, aprendi o que era o mundo lá fora. Drogas e todas as malícias que a rua poderia trazer. Conheci também muitas pessoas LGBTQIA+, que também tinham sido expulsas de casa.
Nesse período conheci um homem, com quem casei e tive uma filha.
A dificuldade da maternidade
Quando fui ter minha filha foi inusitado. A médica pegou ela e colocou perto de mim, na hora minha reação foi falar: Credo, ela está cheia de sangue, tire daqui.
Eu não me via tendo filho, mas também não tinha raiva ou algum sentimento ruim pela maternidade. Foi muito difícil para mim o momento da amamentação.
Minha filha tinha apenas alguns dias, eu me olhava no espelho e não conseguia ver uma imagem feminina, das mães convencionais. Foi a partir dali comecei a usar as roupas do pai dela, onde me sentia confortável.
Meu despertar como homem trans
Dentro de mim eu ouvia alguém dizer “eu preciso viver”, só não entendia o que era. Foi quando conheci um amigo que era homem trans, ele me falou sua vivência trans, foi então que me identifiquei com a história dele.
Fui em buscar do que estava acontecendo comigo e me aceitando. No primeiro momento, larguei o pai da minha filha, porque não conseguia amar e muito menos dar o prazer que ele queria. Afinal eu estava em um processo de aceitação, na qual ele sempre se mostrava uma pessoa preconceituosa.
Após isso, cortei meu cabelo, comecei a comprar roupas adequadas, que me fazia sentir bem comigo mesmo, e por fim coloquei o Gabriel para fora.
Procurei tantos nomes, até colocar o Gabriel e depois veio a sugestão do Luiz Gabriel e assim ficou.
Hoje eu sou independente. Estudo, tenho dois trabalhos, minha loja e a profissão de acompanhante.
Minha família tem uma pequena noção do que faço, mas não opina. Atualmente, posso dizer que eu tenho roupas novas, um sapato, coloco comida na minha mesa e enfrento diariamente o preconceito de ser homem trans, periférico e acompanhante. Tudo isso sozinho, lutando diariamente por uma vida melhor.
O Luiz Gabriel é uma peça fundamental, onde criou dois times em Pernambuco para homens trans, deu início a um coletivo, que hoje é uma instituição e vem ajudando pessoas trans/travesti na sua transição de gênero. E tenho muito orgulho do homem que sou hoje em dia.